Fuxico: uma rede livre feminista

 

Muita gente pode não saber, mas fuxico, além de ser o nome atribuído a prática do mexerico e um tipo de artesanato, também é uma rede livre feminista criada por mulheres que querem democratizar o conhecimento e a tecnologia de/entre/para mulheres.

“A Fuxico é um software livre baseado em um software já existente chamado Pirate Box, muito utilizado por grupos que trabalham com tecnologias livres em lugares onde não há internet, mas nós pensamos, a partir de experiências práticas que tivemos com grupos feministas, que seria mais interesse mudar um pouco essa linguagem do pirata, porque para nós não existe essa relação tão forte quanto a que há na Europa e em outros países”, explica Carla Jancz, do Coletivo MariaLab, de São Paulo (SP), que é uma das desenvolvedoras da tecnologia.

Geisa Santos, do Coletivo Periféricas, de Salvador (BA), que também é criadora da Fuxico, relata que a aplicação é um dispositivo desenvolvido colaborativamente para organizações e coletivos feministas, mas também tem sido utilizada por comunidades tradicionais e em regiões em que não há acesso à internet.

A ideia é que estes coletivos possam ter outro tipo de narrativa que não seja permeada por organizações privadas, que querem roubar dados e tirar a privacidade destes sujeitos. “Com esse dispositivo, as pessoas conseguem ter autonomia sobre o que elas querem compartilhar umas com as outras, tanto do ponto de vista de conteúdo, mas também de como fazer a gestão desse recurso”, defende Geisa.

Para Carla, a ideia do Fuxico é muito simbólica para falar de redes de conhecimento. “Nós desenvolvemos práticas em que cada um costura seu fuxico e ele representa um interesse diferente, seja em tecnologia, em segurança digital, na causa LGBT. É isso que o fuxico pode ser, essa biblioteca construída colaborativamente de conteúdos que não precisam da internet”, afirma.

Entretanto, Carla lembra que a Fuxico não se pretende como uma substituta da internet. A ideia não é trabalhar em grande escala. Ao contrário, é justamente trabalhar em pequena escala, pensando como uma tecnologia digital pode auxiliar grupos coletivos. “Ela pode perfeitamente ser usada como o servidor de uma rede comunitária, que são redes de comunicação em espaços onde tradicionalmente não há, onde as empresas de telecomunicação não entram, onde elas não têm interesse econômico”, completa ela.

Além deste objetivo, Geisa defende que é importante refletir sobre a descolonização e ressignificação de narrativas que a proposta promove. “Fuxico é uma coisa que todo mundo conhece como negativa, mas para nós ele representa a retomada dos conhecimentos de mulheres, de mulheres juntas, de comunidades juntas fazendo coisas colaborativamente”, encerra ela.

No VI Simpósio Internacional LAVITS, realizado entre os dias 26 e 28 de junho, na Universidade Federal da Bahia (UFBA), teve oficina de Fuxico, impulsionando estes debates sobre tecnologia e segurança, em diálogo com as discussões sobre poder, gênero e raça. Esta edição do Simpósio – promovido pela Rede Latino-americana de Estudos sobre Vigilância, Tecnologia e Sociedade (LAVITS), pelo Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos (IHAC/ UFBA) e pelo Grupo de Pesquisa em Gênero, Tecnologias Digitais e Cultura (GIGA/ Facom/ UFBA) – se propôs a refletir sobre Assimetrias e (In)Visibilidades: Vigilância, Gênero e Raça, na ocasião em que a Rede LAVITS completa dez anos.

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