Zuckerberg e sua Internet.org começam a atuar no Brasil

Por Ana Paula Zaguetto

Durante a Cúpula das Américas, a presidente Dilma Rousseff e o empresário Mark Zuckerberg, CEO do Facebook, assinaram uma parceria para aumentar a inclusão digital no país. Ainda não estão definidas as ações que serão colocadas em prática, mas elas fazem parte do projeto Internet.org, uma iniciativa do Facebook e de empresas do setor de tecnologia (Ericsson, Mediatek, Opera, Samsung, Nokia e Qualcomm) para tornar a internet acessível para dois terços da população mundial que ainda não estão conectados.

Lançado em 2013, esse projeto já está presente em outros países da América Latina, África e Ásia. De acordo com o site, a Internet.org pretende oferecer acesso a serviços básicos por meio de um aplicativo, sem cobrar pelo uso de dados, investir em tecnologia para aumentar a conectividade e desenvolver aplicativos que funcionem nas mais diversas condições de rede. Basicamente, a ideia é conectar todas as pessoas no planeta, até as regiões mais remotas, mesmo que elas não tenham condições de pagar pelo acesso.

O aplicativo permite usar gratuitamente serviços de informação sobre saúde, vagas de emprego, Messenger, Wikipedia, busca do Google e Facebook. O discurso de Zuckerberg para conectar o mundo todo sustenta-se na concepção de que o acesso à internet permite que as pessoas façam parte da “economia do conhecimento”, em que informação, tecnologia e inovação são o motor do desenvolvimento econômico. O fundador do Facebook defende que estimular a economia do conhecimento é “a chave para resolver muitos dos nossos grandes desafios sociais e econômicos”, e que a expansão da internet pode tirar 160 milhões de pessoas da pobreza e gerar 140 milhões de empregos.

Para o Facebook, conectar em sua rede quem ainda está offline representa um salto gigantesco nos lucros. Atualmente são quase 1,4 bilhões de usuários, que lhe garantiram um lucro de 2,94 bilhões de dólares em 2014.

Foco em regiões pobres e em desenvolvimento

A consultoria McKinsey, com colaboração do Facebook, realizou um estudo, ano passado, para identificar as principais barreiras ao acesso à internet. Os resultados foram divididos em quatro grupos: incentivo, baixa renda, capacidade do usuário e infraestrutura. O relatório apresenta uma análise de 25 países e aponta que são 4,4 bilhões de pessoas sem acesso. Estão relacionados aspectos como a concentração da população em áreas rurais (aproximadamente 64% dos indivíduos), idade (18% têm mais de 55 anos) e taxa de analfabetismo (em torno de 28%).

Em um índice com escala de 0 a 100, os Estados Unidos apresentam a melhor conectividade, com 94 pontos. Por último, está a Etiópia, com 1 ponto. O Brasil aparece em uma situação intermediária, com 61 pontos.

O estudo estima que 50% da população offline seja de baixa renda. Para alcançar esse público, a Internet.org faz parcerias com governos, operadoras de celular e até investimento em drones movidos à energia solar para para levar conexão à internet às regiões remotas.
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No Brasil, o Facebook acaba de instalar um laboratório em Heliópolis, favela mais povoada de São Paulo, com 200 mil habitantes. Pretende ensinar a 5 mil pequenos empreendedores do local a utilizar o site da rede social para promover seus negócios, o que deve gerar renda para o Facebook, por meio da venda de publicidade direcionada.

O planejamento do laboratório foi feito com o apoio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Em 2014, a parceria já havia sido feita para criar um jogo online para empreendedores, que ensinava a fazer marketing digital no Facebook.

Além disso, também estão nos planos de Zuckerberg instalar redes wi-fi gratuitas em comunidades carentes.

Vigilância do mercado

Um aspecto a ser considerado nos planos da Internet.org é o crescimento exponencial dos dados dos usuários recolhidos pela empresa e seus parceiros no projeto, como o buscador do Google.

Conforme analisam pesquisadores da Rede Lavits no artigo “Maquinaria da privacidade”, “a possibilidade de coletar dados, arquivar, monitorar, conhecer, reconhecer, identificar, classificar e perfilizar não é mais uma prerrogativa do Estado”. As tecnologias de informação e comunicação possibilitam que empresas possam coletá-los e utilizá-los para geração de renda. É assim que o Facebook vende publicidade direcionada. É um mercado em expansão, mais ainda sem legislação adequada para regular essas atividades.

A coleta e o uso dos dados, mesmo sem revelar a identidade dos indivíduos, insere-se no debate sobre privacidade. Em março desse ano, o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou a nomeação de um relator sobre o direito à privacidade, o que mostra que há um esforço global para proteção desse direito. Por sua vez, Zuckerberg tece declarações sobre o fim da era da privacidade e adota estratégias para incentivar os usuários a compartilharem mais informações.

Publicada originalmente na revista ComCiência em 16/04/2015

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