Iniciativas que apoiam o banimento do reconhecimento facial avançam no Brasil

Neste texto, originalmente publicado no blog do MediaLab.UFRJ, Debora Pio aborda iniciativas de banimento de tecnologias de reconhecimento facial lançadas em 2022. A Rede Lavits contribui para a construção de algumas dessas campanhas.

* Por Debora Pio 

O Rio de Janeiro foi uma das primeiras cidades, junto com São Paulo e Salvador, a implementar as tecnologias de reconhecimento facial com finalidades de segurança pública. Isto aconteceu justamente no contexto de crescimento da extrema-direita no país, onde “combater o crime” utilizando aparatos tecnológicos tornou-se a nova tendência. Junto com o reconhecimento facial vieram também as propagandas de drones atiradores, mísseis disparados à distância e monitoramento preditivo: ferramentas utilizadas em regiões do planeta que atravessam guerras de fronteira e territórios.

Além do reconhecimento facial, as outras ainda não entraram em operação no setor público – pelo menos até onde se tem notícias. Ainda assim, até hoje não foi apresentada uma justificativa razoável para a manutenção deste tipo de tecnologia como ferramenta de segurança pública. Além do alto preço de instalação e manutenção dos equipamentos, as cidades que instalaram as câmeras ainda não apresentaram nenhum estudo ou relatório que prove a eficácia, como diminuição da incidência de crimes ou prisões em flagrante. Outra consideração é que os bancos de dados de imagens utilizados para fazer o “match” com as imagens capturadas das ruas estão defasados ou equivocados, possuindo imagens de pessoas que já estão cumprindo pena, já morreram ou até mesmo atores de Hollywood que jamais estiveram no país. Como o caso da polícia do Ceará que colocou o ator Michael B. Jordan como um dos suspeitos de uma chacina. 

Em contrapartida, as falhas são cada vez mais identificáveis. A incidência de erros gerados por este tipo de monitoramento afeta sobretudo pessoas que já sofrem com algum tipo de vulnerabilidade, como pessoas negras, mulheres, pessoas trans e população em situação de rua.

Por isso, o Brasil vem sendo um dos precursores na América Latina na discussão sobre o banimento do reconhecimento facial em locais públicos. No ano passado, dois projetos de lei foram protocolados no Rio de Janeiro, na esfera municipal(com o vereador Reimont, do PT)  e estadual (com a deputada estadual Dani Monteiro, do PSOL), pedindo o banimento das tecnologias de reconhecimento facial em espaços públicos.

Já em São Paulo, graças à articulação do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e entidades como Intervozes e Artigo 19 Brasil, a justiça impediu o projeto de reconhecimento facial no metrô. Na Argentina também foi pela via judicial que conseguiram banir o reconhecimento facial na cidade de Buenos Aires. Estas iniciativas foram abordadas durante o evento “Derechos humanos, justicia social y tecnologías: fortaleciendo redes en América Latina“, promovido pela Derechos Digitales.

Aos poucos, o Sul Global também caminha para fazer intervenções nesta tecnologia desenvolvida para manter à margem este trecho do globo. O reconhecimento facial precisa ser banido porque as motivações que levaram à criação e ao uso destas tecnologias são , em si, equivocadas e aprofundam discriminações históricas.

Veja as iniciativas lançadas em 2022 e que o MediaLab.UFRJ vem contribuindo para a construção.

#SaiDaMinhaCara 

A iniciativa, capitaneada pelo MediaLab.UFRJ, Rede Lavits, Coding Rights, O Panóptico e Idec, é um “protocolaço”. As organizações realizaram um trabalho de  advocacy com parlamentares do poder legislativo do país inteiro para que eles e elas protocolassem, ao mesmo tempo, projetos de lei – tanto nas câmaras municipais quanto nas assembleias legislativas – pelo banimento do reconhecimento facial. Mais de 5o parlamentares, de diversos partidos diferentes, demonstraram apoio e protocolaram projetos. O próximo passo é a tramitação e aprovação destes projetos, por isso a articulação continua.

Tire Meu Rosto da Sua Mira 

O projeto é uma iniciativa da Coalizão Direitos na Rede e busca trazer mais clareza sobre os problemas que o reconhecimento facial traz para a segurança pública. Durante o Fórum da Internet no Brasil foi lançado um site (tiremeurostodasuamira.org.br/) onde é possível assinar uma carta cujo objetivo é o banimento total das tecnologias digitais de Reconhecimento Facial na Segurança Pública brasileira, diante das evidências de seu uso abusivo e pouco transparente. A capacidade de identificar individualmente e rastrear pessoas mina direitos como os de privacidade e proteção de dados, de liberdade de expressão e de reunião, de igualdade e de não-discriminação. É possível assinar tanto como organização da sociedade civil quanto pessoa física.

Sem Câmera na Minha Cara 

A prefeitura de Recife pretende fazer um experimento instalando 108 câmeras de reconhecimento facial pela cidade. Pior: estas câmeras são parte de estruturas do mobiliário urbano, como relógios e máquinas de monitoramento do trânsito. Tudo isso ao custo de milhões de reais que saem direto do bolso do contribuinte.  Diante de mais este absurdo, as organizações como IP.Rec, Rede de Justiça Criminal, Rede Lavits, Articulação Negra de Pernambuco, OAB Pernambuco, Centro Popular de Direitos Humanos e Natrape se juntaram à rede Meu Recife e lançaram a campanha “Sem Câmera na Minha Cara” (semcameranaminhacara.meurecife.org.br) , que já enviou mais de 700 e-mails ao Prefeito João Campos para barrar a instalação das câmeras.

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