‘Os dados são uma forma de gerenciamento policial das populações’, afirma Natalie Byfield

 

As tecnologias usadas pelo estado racial nos sistemas contemporâneos de vigilância estão reproduzindo uma dinâmica de poder que foi estabelecida nos EUA nos tempos de colônia, durante o capitalismo mercantil”. A afirmação é da Prof.ª Dr.ª Natalie Byfield, do Departamento de Antropologia e Sociologia da St. John’s University (EUA), que esteve na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) na última segunda-feira (26) para uma conferência sobre Raça, Ciência e Opressão.

O evento foi organizado pelo Grupo de Pesquisa sobre Cidadania, Violência e Administração de Justiça (CiVAJ), pelo Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) e pelo Laboratório de Tecnologia, Política e Conhecimento (Pimentalab). Além disso, a organização contou com o apoio da Rede Latino-americana de Estudos sobre Vigilância, Tecnologia e Sociedade (LAVITS).

Preocupada com temas como hegemonia, produção e reprodução de desigualdades no mundo ocidental e justiça social, Byfield centra suas pesquisas em reflexões acerca da linguagem, dos sistemas de mídia, das tecnologias e metodologias de pesquisa. Na conferência realizada na Unifesp, a professora expôs uma pesquisa sobre policiamento preditivo em Nova York e racialização da violência e vigilância, a partir de dados de cinco milhões de abordagens policiais realizadas entre 2003 e 2013, durante a prefeitura de Michael Bloomberg. Nesta investigação, ela questiona o uso de ciência e tecnologia supostamente neutras, como Inteligência Artificial e algoritmos, no trabalho policial.

Para a pesquisadora, as práticas de vigilância e policiamento são centrais para o neoliberalismo e o capitalismo informacional. “Esta conferência apresenta uma contra-história do discurso sobre policiamento. Este momento do policiamento está sendo reconstruído como uma ciência racial, com um conjunto de falácias que têm sido consideradas legalmente como fatos”, declarou ela.

Byfield se utiliza do conceito de “criminalização de tudo” para analisar o racismo e o policiamento em Nova York. De acordo com seu trabalho, a construção de um estado carcerário no século XX ocorreu junto de uma nova era das formas de vigilância. Atualmente, os mecanismos de controle dispõe de estratégias que lançaram grandes redes, armadilhas, informantes e tecnologias que criaram ou coletaram dados sobre indivíduos e grupos sociais.

Para ela, “enquanto as revoluções da informática marcaram o nascimento do capitalismo informacional, que ao mesmo tempo tempo diminuiu a necessidade do trabalho e aumentou a necessidade de controle social, o estado se transformou em um regime baseado no biopoder”. O estado, de acordo com Byfield, implantou formas díspares e novas tecnologias para gerenciar a vida em sociedade. Neste contexto, jovens negros e latinos se tornaram alvo central destas estratégias de controle. “Em muitos casos, as tecnologias levaram a concluir que certas pessoas, especialmente as não-brancas, precisavam de mais vigilância e que os seus comportamentos representavam atividades criminais”, declara. Nas cinco milhões de abordagens de pedestres realizadas no período da investigação apresentada pela pesquisadora, as pessoas negras, que são 25% da população de Nova York, somaram 54% das pessoas abordadas.

Byfield acredita que muitos pesquisadores estejam preocupados com a chamada guerra às drogas e com o estado carcerário nos EUA. No entanto, ao olhar para o caso de Nova York, ela percebeu que parte dos acadêmicos não estavam falando sobre raça como uma questão para entender o encarceramento. “O ato de policiamento em um estado racial, não pode estar distinguido ou separado da racialização. Policiamento e racialização são a mesma coisa”, defende.

No site profissional da pesquisadora, há publicações disponíveis para conhecer seu trabalho. Acesse aqui.

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