Autora do texto Surveillance capitalism, AI and microtask platforms in pandemic times, parte da série #Lavits_covid19, Nahema Falleiros elaborou a pedido da Lavits uma lista com referências sobre capitalismo e vigilância, trabalho digital, precariedade e plataformas de micro-tarefas. Mestra em Sociologia pela FFLCH-USP, doutoranda em Ciência da Informação no PPGCI-IBICT-ECO-UFRJ e integrante do grupo ComMarx, Falleiros organizou a lista em 10 tópicos a seguir:
1. Para quem quer saber um pouco mais sobre a face oculta do trabalho digital na nova indústria da IA indico a leitura do artigo (não acadêmico) Seremos, por fim, servos de máquinas?, publicado na série Trabalho e Precariado do site Outras Palavras, no final de abril/começo de maio de 2021. Neste outro artigo disponível em português aqui, há inclusive referências complementares às desta lista. Já para quem prefere ouvir e/ou ver à respeito, há uma apresentação de 15 minutos feita para o GT4 do Primeiro Seminário Internacional do grupo de pesquisa ComMarx, realizado remotamente, no dia 16 de abril de 2021. A apresentação, cujo título é Mercado de dados ou de trabalho com dados?, está disponível no Youtube aqui.
2. Sobre a relação entre capitalismo e vigilância, indico o livro de Shoshana Zuboff, A era do capitalismo de vigilância, publicado originalmente em 2019 e com tradução em português lançada neste ano. Ou então o artigo Big other, publicado originalmente em 2015 no Journal of Information Technology e disponível em português no livro da Lavits Tecnopolíticas da vigilância: perspectivas da margem, que pode ser baixado gratuitamente aqui.
3. Para uma crítica ao emprego de termos como “capitalismo da vigilância” ou de “plataformas”, “cognitivo”, “digital” ou “informacional” e outros tantos que tentam dar ênfase às muitas dimensões do capitalismo contemporâneo, indico o livro (especialmente a introdução) de Ursula Huws, Labour in contemporary capitalism: what next?, publicado em 2019.
4. Para uma introdução ao debate sobre trabalho digital, há o livro de Dominique Cardon e Antonio Casilli, Qu’est-ce que le digital labor?, publicado em 2015. E também o livro organizado por Trebor Scholz, Digital labor, publicado em 2012. Neste livro, vale a pena ler o capítulo de Ayhan Aytes, Return of the crowds, sobre a Amazon Mechanical Turk (Amazon Mturk). Para uma discussão sobre trabalho digital no Sul Global, indico o artigo de Rafael Ghromann e Jack Qiu, Contextualizando o trabalho em plataformas, publicado em 2020 no dossiê trabalho de plataforma, da Revista Contracampo. Também não poderia deixar de indicar o livro seminal de Marcos Datas, Trabalho com informação, publicado em 2012 – resultado de sua dissertação de mestrado, defendida em 1995 no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação do IBICT em convênio amplo com a ECO da UFRJ. O artigo de Ghromann e Qiu está disponível para baixar gratuitamente aqui e o livro de Dantas, acolá.
5. Sobre o problema da precarização do trabalho no Brasil, há o livro de Ricardo Antunes, O privilégio da servidão, publicado em 2018. Ou então o livro organizado por ele e Ruy Braga, Infoproletários, publicado em 2009. Além do capítulo de Braga, indico também a leitura do capítulo de Ursula Huws. Trata-se da tradução feita por Fernando Ferrone de seu ensaio, The making of a cybertariat?, publicado na revista Socialist Register em 2001. O artigo está disponível para baixar aqui.
6. Sobre as condições de trabalho na Amazon MTurk e o que pensam seus trabalhadores no Brasil, indico a tese de Renan Kalil Capitalismo de Plataforma e Direito do Trabalho defendida em 2019, disponível aqui. Além dela, há o artigo de Bruno Moreschi, Gabriel Pereira e outros, The Brazilian Workers in Amazon Mechanical Turk, publicado no dossiê trabalho de plataforma em 2020, já citado e disponível aqui.
7. Para uma história das técnicas de aprendizado de máquina usadas hoje na indústria da IA ver o capítulo, Mechanized significance and machine Learning, de Aaron Mendon-Plasek no livro The Cultural Life of Machine Learning, organizado por Jonathan Roberge e Michael Castelle, publicado em 2021. O capítulo está disponível para baixar gratuitamente aqui. Indico também O manifesto nooscópio de Matteo Pasquinelli e Vladan Jodler, publicado no https://nooscope.ai/, em 2020. O manifesto foi traduzido por Leandro Módolo e Thais Pimentel para a LAVITS no mesmo ano e está disponível aqui. Vale ler também o artigo de Dominique Cardon, Jean Cointet e Antoine Mazières, La revanche de neurones, publicado na Réseaux, em 2018. Neste artigo, os autores tratam da controvérsia sócio-técnica entre pesquisadores filiados às abordagens simbólica e conexionista, dois paradigmas da IA. É possível baixa-lo gratuitamente aqui.
8. Como “clássicos são clássicos e vice versa”, impossível não indicar a leitura de Os manuscritos econômico-filosóficos, de Marx. Nestes rascunhos, já encontramos as primeiras densas formulações de Marx sobre o conceito de alienação do trabalho no capitalismo. Já A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Engels, nos oferece uma pioneira e densa etnografia do chão de fábrica nos tempos da “Revolução industrial”. Traduções excelentes destes dois clássicos do século XIX, pra lá de atuais, foram publicadas pela editora Boitempo. Também indico a leitura de outro clássico, desta vez, do século XX: o livro de Harry Braverman, Labor and monopoly capital, publicado em 1974. Sua tradução foi feita por Nathanael Caixeiro e publicada em 1977 pela editora Zahar sob o título Trabalho e capital monopolista.
9. Para uma tipologia do trabalho mediado pelas plataformas de micro tarefas, indico o relatório de Florian Schmidt, Digital labour markets in the platform economy, publicado em 2017, o de Janine Berg e sua equipe, Digital labour platforms and the future of work, publicado em 2018, e o artigo de Paola Tubaro, Casilli e Marion Coville, The trainer, the verifier, the imitator, publicado em 2020 no jornal Big Data & Society. O primeiro relatório está disponível para baixar gratuitamente aqui, o segundo acolá e o artigo aqui. Vale muito a pena acompanhar as publicações de acesso aberto dos demais relatórios da International Labour Organization (ILO) relacionadas ao tema do trabalho digital. Indico também o livro de Casilli, En attendant les robots, publicado em 2019. Neste livro, o autor faz uma genealogia da noção de plataforma. Além deste, há também, entre outros, o de Mary Gray e Siddarth Suri: Ghost Work, publicado no mesmo ano. Neste livro são apresentados dados quantitativos e qualitativos, inclusive etnográficos, sobre quem são e o que pensam estes trabalhadores socialmente invisibilizados, nos Estados Unidos e na Índia. Seu guia de leitura e suas referências bibliográficas estão disponíveis para baixar gratuitamente aqui.
10. Por fim, indico duas newsletters gratuitas voltadas para a pesquisa acadêmica ou de políticas públicas: a Digilabour da Unisinos (de longe, uma das mais completas) e a Updates in Labor & Tech, do Data & Society. Há também newsletters pagas como The Algorithm, da MIT Tech Review, e a The Shift, esta última interessante sobretudo para quem pesquisa o discurso ou a ideologia da inovação na IA ou no aprendizado de máquina. Além destas newsletters, há algumas obras de arte que podem inspirar nossas reflexões sobre um mundo do trabalho cada vez mais mediado por plataformas digitais que reforçam a precariedade.
Nesta lista de leituras (nada exaustiva!) acrescentaria também o filme de Ken Loach, Você não estava aqui, lançado em 2019. Já o filme Nomadland, de Chloé Zaho, vencedor do Oscar de 2021, está na lista dos que eu pretendo ver em breve, depois que li a sinopse, América redescoberta, de José Geraldo Couto, publicada em abril de 2021 no Blog do Cinema. Vale ver também o documentário de Hans Block e Moritz Riesewieck, The Cleaners, lançado em 2018, e o curta de Bruno Moreschi e Gabriel Pereira, Recoding Art, lançado em 2019 no festival É Tudo Verdade.
Imagem: Hugo Gellert ,Machinery and Large-Scale Industry: The Value Transferred by Machinery to the Product, 1933